COVID-19: IMPLICAÇÕES NEUROPSIQUIÁTRICAS

A comunidade científica vem se interessando pelos aspectos neuro psiquiátricos da covid 19, já que a doença apresenta fenômenos sistêmicos, não acometendo apenas o trato respiratório como suspeitado no início. O SARS COV 2 demonstra neurotropismo, além do fato da inflamação sistêmica comprometer a barreira hemato encefálica e inundar o cérebro com fatores pró inflamatórios.O vírus pode cruzar a barreira hemato encefálica por transporte axonal retrógrado via bulbo olfatório e infectar o cérebro promovendo gliose reativa , o que leva a aumento de produção e secreção de citocinas e outros fatores pró inflamatórios. O vírus pode ainda chegar ao cérebro através da: - Vasculatura cerebral, - Espaços perivasculares do sistema glinfático(sistema administrado pelas células da glia com atuação semelhante ao sistema linfático), - Outros nervos, como o trigêmeo ( que projeta terminais nociceptivos na cavidade nasal), - Fibras sensoriais do nervo vago, que inervam o trato respiratório, - e através de via hematogênica (leucócitos). Amostras post mortem encontraram SARS COV2 em nervo olfatório, girus rectus e no tronco cerebral ,com sinais de profundo dano a todos os elementos do tecido, incluindo células gliais, neurônios, seus axônios e mielina. Devido a carga viral em tronco cerebral e à redução subsequente da expressão de ACE2 associada a morte neuronal, podem ocorrer alteração em baro receptores e consequente aumento do tônus simpático, gerando hipertensão severa com risco à vida. Outro conhecido método de dano ao SNC por SARS COV2 é a encefalite. Esta invariavelmente afeta não somente o tronco cerebral, mas também o tálamo e a substância branca. Neste caso os sintomas respiratórios podem derivar, pelo menos em parte, de dano encefalítico ao tronco cerebral. A penetração do vírus no SNC, associada a sofrimento cerebral derivado da inflamação sistêmica e associada ainda a forte estresse ambiental e aspectos emocionais do paciente, como medo da pandemia, sofrimento por estadia em enfermarias ou UTIs, sofrimento por restrições sociais, entre outros, promovem o surgimento ou exacerbação de patologias psiquiátricas. Dentre elas destacam-se: Transtorno depressivo maior, transtorno bipolar, psicoses, transtorno obcessivo compulsivo e transtorno de stress pós traumático. Um estudo acompanhou 62354 pacientes por um período de 14 a 90 dias depois de diagnosticados com covid. Estes pacientes não tinham diagnóstico prévio de doença psiquiátrica. Foi verificado nos pacientes COVID um risco uma a três vezes superior de ocorrência de patologias psiquiátricas se comparados ao desenvolvimento de doenças clínicas diversas(ex influenza, outras infecções do trato respiratório, infecções de pele, colelitíase, urolitíase). As principais doenças psiquiátricas percebidas nesse estudo foram ansiedade, demência e insônia. A incidência de diagnósticos psiquiátricos foi de 18.5 por cento, sendo 5.8 por cento primeiro diagnóstico. Crescentes evidências ligam a ativação imune que ocorre na COVID19 com depressão e ideação suicida, sendo que estas podem responder a tratamento com anti-inflamatórios. Uma recente metanálise de desfechos psiquiátricos emm SARS, MERS e COVID19 observaram dois padrões temporais de doença: 1) aguda: predominantemente delirium. 2)tardia: predominantemente depressão, ansiedade e stress pós traumático. No Qatar um estudo analisou 50 pacientes infectados por SARSCOV2 2, destes 17 apresentando história pregressa de transtorno bipolar ou psicose. Foram encontrados 9 pacientes com psicose, 8 com reações aguda a stress, 8 com ansiedade, 8 com depressão e 8 com mania, num total de 41 de 50 pacientes apresentando patologia psiquiátrica. 3 pacientes apresentaram auto agressão. Metade dos pacientes com mania ou psicose não tinham história psiquiátrica. Outro estudo focou em presença de transtornos psiquiátricos em pacientes sobreviventes de doença crítica por coronavírus, um ano após a alta hospitalar. Neste foi observada uma prevalência de 29 por cento de depressão, 34 por cento de ansiedade e 34 por cento de transtorno de stress pós traumático na amostra, com um total de 97 por cento dos pacientes apresentando algum diagnóstico psiquiátrico. Conclui-se que achados comuns em pacientes COVID19 incluem depressão, ansiedade, insônia e stress pós traumático. Além destes, é importante atentar ao fato de que dificuldades cognitivas são comuns em pacientes que permaneceram em UTI. A maioria dos pacientes que tiveram síndrome de estresse respiratório agudo apresentaram dificuldade de memória, atenção, concentração e velocidade de processamento, com síndrome disexecutiva em um terço dos pacientes que apresentaram doença grave. A evolução cognitiva ao longo do tempo é variável e necessita de mais dados, porém observa-se clinicamente que grande parte dos pacientes apresentam boa recuperação. Podem ainda ocorrer encefalite ou encefalomielite agudas por covid, especialmente em imunocomprometidos ou imunodeficientes, e transtorno cerebro vascular devido ao estado pró coagulante característico da doença. Devemos atentar ainda para surgimento ou exacerbação de transtorno bipolar, psicoses, TOC, epilepsia e esquizofrenia. Fonte: JAMA PSYCHIATRY JULY 31 2020 BJPSYCH, SET 2020 THE LANCET PSYCHIATRY JULY 2020 TRANSLATIONAL PSYCHIATRY, 2020

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